CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO é professor titular da
PUC/SP e um dos mais notáveis e respeitados juristas do Brasil. São de
sua autoria os textos que se seguem.
Considerando
que a Lei do Desarmamento, a pretexto de regulamentar, na verdade,
dificulta severamente e praticamente impede o exercício do direito de
defesa, ele, inicialmente, descreve o cenário em que essa proibição está
sendo aplicada:
“Ora bem. É
fato público e notório que o Estado não tem conseguido oferecer sequer
um mínimo de tranqüilidade e segurança aos cidadãos. Ninguém ignora que a
absoluta incapacidade estatal de oferecer o mais modesto padrão de
segurança levou os abastados a blindarem os próprios automóveis,
fomentando o surgimento de uma indústria produtora destes equipamentos. É
sabido e ressabido que proliferam empresas de segurança, para oferecer
aos que dispõem de recursos para pagá-las, ora cortejos de veículos
destinados a proteger-lhes as deslocações por automóvel, ora – o que é
muitíssimo comum – veículos com seguranças circulando pelos bairros
nobres e hoje, até mesmo em bairros modestos, para buscar minimizar os
riscos que se disseminaram por todos os cantos e mais duramente ainda
entre os mais pobres.”
Diante disso,
demonstra o consagrado Mestre que tal proibição afronta claramente os
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, configurando patente
absurdo:
“Tocaria às
raias da crueldade pretender que o cidadão deva sentir-se rigorosamente
inerme, indefeso, entregue ao líbito dos assaltantes, quer na rua, quer
na intimidade da própria casa (suposto asilo inviolável do indivíduo),
enquanto seu agressor vem armado, pronto para subjugá-lo de maneira
completa e, tanto mais ousado e abusado quanto mais seguro estiver de
que sua vítima não possui arma de fogo alguma capaz de se opor a seus
propósitos.”
E daí extrai a incontestável conclusão, rigorosamente jurídica:
“Em face da Lei
Magna do país, o cidadão jamais poderá ser proibido de tentar defender
sua vida, seu patrimônio, sua honra, sua dignidade ou a incolumidade
física de sua mulher e filhos a fim de impedir que sejam atemorizados,
agredidos, eventualmente vilipendiados e assassinados, desde que se
valha de meios proporcionais aos utilizados por quem busque submetê-los a
estes sofrimentos, humilhações ou eliminação de suas existências.
A Constituição Brasileira não autoriza a que seja legalmente qualificado
como criminoso, e muito menos como sujeito eventual à pena de reclusão,
o cidadão que tente defender a própria vida, o patrimônio, a honra, a
dignidade ou a incolumidade física de sua mulher e filhos usando de
meios proporcionais aos utilizados por quem busque infligir-lhes estes
sofrimentos, humilhações ou eliminação de suas existências ou então que
simplesmente se aprovisione de tais meios, na esperança de impedir que
ele ou seus familiares sejam atemorizados, agredidos, e eventualmente
vilipendiados.
Logo, é grosseiramente inconstitucional a lei que para eles concorra ou que abique direta ou indiretamente em tais resultados.”
O texto integral desse extraordinário estudo pode ser lido na Revista
Trimestral de Direito Público, RTDP, Malheiros Editores, nº 41, pág. 27:
CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, “Direitos fundamentais e arma de fogo”
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